“Violência doméstica saiu da invisibilidade com a Lei Maria da Penha”. A afirmação é da Dr. Susana Broglia Feitosa de Lacerda, promotora de Justiça da Vara Especializada em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e Crimes contra Crianças, Adolescentes e Idosos da Comarca de Londrina, e foi dada na noite desta quinta-feira (17/08), no auditório da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Apucarana, durante o “I Encontro Dialógico 11 anos da Lei Maria da Penha: pelo fim da violência contra a mulher”.
A iniciativa foi uma promoção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio da Comissão da Mulher Advogada, com apoio da Secretaria da Mulher e Assuntos da Família da Prefeitura de Apucarana, por meio do Centro de Atenção à Mulher (CAM). “Hoje se fala do assunto, que antes ficava em quatro paredes”, disse a promotora de Justiça. De acordo com Dra. Susana, se hoje existem mais denúncias é em razão da conscientização feita a partir da Lei Maria da Penha. “Pode-se ter a falsa impressão de que mais crimes estão acontecendo, mas na realidade são mais crimes que estão sendo denunciados”, disse.
Apesar das conquistas dos últimos 11 anos, ela frisou que muito precisa ser conquistado. “Há necessidade de políticas públicas e de ações do Estado que dêem cumprimento à Lei, que não veio apenas para estabelecer uma punição da violência contra a mulher, mas também para prestar atendimento à vítima e ao autor da violência, e nisto nós estamos ainda engatinhando”, avaliou a promotora, que palestrou sobre o tema “Direitos e Proteção: estudos sobre a violência contra a Mulher”.
De acordo com ela, as medidas protetivas de urgência, afastamento do lar, o distanciamento, a não freqüência a determinados lugares, são eficientes em grande número dos casos para a vítima. “Mas a falta de políticas públicas em algumas situações, no que tange o atendimento do autor da violência, ainda é um ponto previsto em lei a ser fortalecido. Este agressor vai se juntar a outra mulher e vai novamente agredir. A vítima que não vai ter uma assistência vai voltar para este autor e continuar a sofrer. Por isto ainda há um ciclo a ser quebrado e é algo a ser aprimorado dentro do que prevê a Maria da Penha”, pontuou. Ela falou ainda sobre “uma cultura machista de séculos que precisa ser alterada”. “Onde homens foram criados de uma maneira de que precisam ser agressivos, não têm que falar de seus sentimentos, em que as mulheres são tidas como objeto. E isto não se muda da noite para o dia, principalmente quanto ele se comporta de maneira adversa tem do Estado apenas punição e não uma conscientização acerca do seu comportamento”, ponderou.
Doutora Susana, que também é secretária da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar em Londrina, defende uma reconstrução coletiva do pensamento e da educação. “Se não houver isto, ele (agressor) vai continuar educando seus filhos e filhas desta maneira. Enquanto houver esta desconstrução, de que determinados papéis são só de homens ou só de mulheres, nós vamos continuar numa escalada de violência contra a mulher. Um trabalho que deve ser feito nas escolas, nas famílias, na sociedade como um todo, mudar as propagandas, as abordagens, refletir sobre as nossas piadas, nossos comportamentos na rua, as nossas rodas de amigos, o que a gente conversa, como a gente reage a uma vítima que denuncia um estupro, uma violência. Qual é a nossa primeira postura? É credibilizar e acolher, ou é duvidar? A maioria das vezes é duvidar. Então é essa a postura que tem que ser mudada”, concluiu Dra. Susana.
Além da violência doméstica, a secretária da Mulher e Assuntos da Família da Prefeitura de Apucarana, Denise Canesin Moisés Machado, chamou a atenção dos presentes para outra questão que tem em grande parte vitimado mulheres, que é o tráfico de pessoas. “O Brasil é o terceiro no mundo em casos registrados. Onde 86% das vítimas são mulheres com idades entre 9 e 25 anos. Conforme dados do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado do Paraná, de janeiro a julho deste ano houveram 89 denúncias, onde 47 são mulheres”, informou Denise.
Diante desses números, ela destacou que a Secretaria Municipal da Mulher tem a obrigação de alertar a sociedade local para a existência deste tipo de violência e pode estar acontecendo bem perto. “É preciso que saibamos identificar quando uma mulher está sendo vítima de trabalho análogo ao escravo, como por exemplo a exploração doméstica, o casamento servil, o trabalho com jornadas excessivas, entre outras situações. A sociedade precisa estar alerta, pois isto pode estar acontecendo sob nossos olhos”, alertou a secretária.
Com uma rede de combate e atenção estruturada, ela conta que Secretaria da Mulher e Assuntos da Família de Apucarana acompanhou, somente neste primeiro semestre de 2017, quase 1,5 mil vítimas de algum tipo de violência doméstica. Os serviços de atendimento às mulheres são feitos através do Centro de Apoio à Mulher (CAM), que fica na Rua Ouro Verde, 300, no Jardim América, região oeste da cidade. Este acompanhamento é realizado através de serviços de apoio nas áreas psicológica, social e jurídica. O telefone de contato é o 3422-4479. Já denúncias de violência devem ser comunicadas pelos telefones 180 ou 190.
Durante o evento, o juiz de Direito da 2ª Vara Criminal de Apucarana, Dr. Osvaldo Soares Neto, se disse “envaidecido” por estar em uma comarca que conta com uma rede de proteção à mulher vítima de violência. “Parabenizo a secretária Denise e toda sua equipe, que atuam com grande afinco no atendimento à mulher, buscando dar toda assessoria necessária nesse momento, seja psicológico, social ou jurídico”, pontuou o magistrado.
Ele destacou a parceria do Poder Judiciário com a Prefeitura de Apucarana. “Temos um trabalho em conjunto com a Secretaria da Mulher direcionado às mulheres presas, que muitas vezes ingressaram no mundo do crime em razão de seus companheiros. E este projeto tem levado dignidade a elas, ensinando algum tipo de ofício para que quando saírem possam melhor reingressar à vida em sociedade tendo sua renda independente de outras pessoas”, exemplificou Dr. Osvaldo. Ele também parabenizou pela iniciativa do evento e destacou que as vítimas de violência têm, em Apucarana juízes, comprometidos com a celeridade dos processos. “Para que a justiça chegue e não seja tardia”, concluiu.

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